Discipulado: “Sou discípulo de Jesus?”
Mateus 28.16 Os onze discípulos partiram para a Galileia, para o monte que Jesus lhes havia designado. 17E, quando viram Jesus, o adoraram; mas alguns duvidaram. 18Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: — Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. 19Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, 20ensinando-os a guardar todas as coisas que tenho ordenado a vocês. E eis que estou com vocês todos os dias até o fim dos tempos.
Essa é uma das ordens mais conhecidas e admiradas do Senhor Jesus. Após a sua ressurreição Jesus ordena aos seus discípulos que façam outros discípulos em todas as nações da terra. No núcleo da fé cristã encontra-se o desejo de Deus de ter um povo que revele o seu caráter e o faça por meio da obediência à sua Palavra, do relacionamento com ele e uns com os outros. Portanto, ele enviou seu Filho a fim de formar um povo para segui-lo, e parte do ato de seguir Jesus é chamar mais pessoas para o seguirem.
Todavia, o que realmente significa os termos envolvidos nessa ordem tais como: discípulo, discipulado e ir por todas as nações? Quando tentamos definir ou observar essas realidades em nossas próprias vidas as dificuldades logo aparecem e se revelam confusas. Nos últimos anos, o conceito de discipulado, discípulo e discipulador se perdeu em um lago de expressões como moralidade, comportamento e auto promoção.
Para muitas pessoas, para alguém se tornar um discípulo de Cristo é preciso ser uma pessoa moralmente boa, simpática, agradável, equilibrada, responsável, trabalhar o auto aperfeiçoamento físico e espiritual e fazer o seu melhor para ter sucesso em todas as áreas. Mas será que isso significa ser discípulo de Jesus? Como podemos assegurar que somos discípulos de Cristo? Quais os requisitos primordiais de um seguidor do Senhor?
O QUE SIGNIFICA SER DISCÍPULO DE JESUS?
Em linhas gerais, o discípulo é um seguidor, um aluno. Na essência do discipulado está o relacionamento mestre/ensino e aluno/imitador. Um discípulo de Cristo segue os seus passos, agindo conforme ele ensinou e viveu. Até aqui, o discipulado cristão em nada difere de outros relacionamentos de discipulado. Contudo, seguir Jesus significa muito mais do que isso; significa, antes de mais nada, que o discípulo entrou em um relacionamento pessoal e salvador com ele. O aluno está “em Cristo”, como afirma a Bíblia. Foi unido a ele por meio da nova aliança no sangue dele. Por intermédio da morte e ressurreição de Jesus, toda a culpa do pecado que o discípulo cometeu passa a ser dele e toda a justiça que pertence a ele se torna de seu aprendiz. Ser discípulo de Cristo, em outras palavras, não tem início em algo que nós fazemos. O processo começa com algo que Cristo fez. Marshall e Payne no livro “Projeto Videira” definiram discípulo de Cristo como: “Um pecador perdoado que está aprendendo Cristo em arrependimento e fé”. No clássico da literatura cristã “Discipulado” Bonhoeffer faz uma longa e profunda análise do que significa ser discípulo:
Portanto, o chamado ao discipulado é o compromisso exclusivo com a pessoa de Jesus Cristo, a subversão de todo legalismo por meio da graça daquele que chama. É o chamado da graça, e também o mandamento da graça. Vai além do antagonismo entre lei e evangelho. Cristo chama, o discípulo simplesmente o segue. Isso é graça e mandamento unidos em uma coisa só. “E andarei com largueza, pois me empenho pelos teus preceitos" (Sl 119.45). O discipulado é compromisso com Cristo; porque Cristo existe, tem de haver discipulado.
Ainda sobre o assunto, Bonhoeffer acrescenta:
O que sabemos sobre o conteúdo do discipulado? “Segue-me! Vinde após mim!” Isso é tudo. Segui-lo parece algo sem conteúdo. Não é algo que de fato pode ser visto como programa de vida cuja realização faça sentido. Não é, igualmente, um objetivo ou um ideal a ser alcançado. Para os padrões humanos, não é algo que mereça sacrifício ou pela qual valha a pena investir a vida.
BASE BÍBLICA
Marcos 8.31 Então Jesus começou a ensinar-lhes que era necessário que o Filho do Homem sofresse muitas coisas, fosse rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos escribas, fosse morto e que, depois de três dias, ressuscitasse. 32E isto ele expunha claramente. Então Pedro, chamando-o à parte, começou a repreendê-lo. 33Mas Jesus, voltando-se e vendo os seus discípulos, repreendeu Pedro e disse: — Saia da minha frente, Satanás! Porque você não leva em consideração as coisas de Deus, e sim as dos homens. 34Então, convocando a multidão e juntamente os seus discípulos, Jesus lhes disse: — Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. 35Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá; e quem perder a vida por minha causa e por causa do evangelho, esse a salvará. 36De que adianta uma pessoa ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? 37Que daria uma pessoa em troca de sua alma? 38Pois quem, nesta geração adúltera e pecadora, se envergonhar de mim e das minhas palavras, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória do seu Pai com os santos anjos.
Essa passagem nos apresenta os fundamentos do discipulado cristão, delineando o alto custo de seguir a Cristo, seus inimigos e a profunda recompensa.
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A base do discipulado é o sacrifício de Cristo.
31 Então Jesus começou a ensinar-lhes que era necessário que o Filho do Homem sofresse muitas coisas, fosse rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos escribas, fosse morto e que, depois de três dias, ressuscitasse. 32E isto ele expunha claramente.
A morte substitutiva de Jesus pela humanidade, o seu sofrimento na cruz, a sua perseguição e finalmente sua ressurreição são os fundamentos essenciais e os motivos pelos quais as pessoas devem seguir a Cristo. Qualquer outra motivação para seguir ao Senhor que não envolva o seu evangelho, inevitavelmente, corrompe e danifica mortalmente o discipulado.
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Os inimigos do discipulado.
32E isto ele expunha claramente. Então Pedro, chamando-o à parte, começou a repreendê-lo. 33Mas Jesus, voltando-se e vendo os seus discípulos, repreendeu Pedroe disse: — Saia da minha frente, Satanás! Porque você não leva em consideração as coisas de Deus, e sim as dos homens.
O discípulo encontrará três oposições ao ingressar no discipulado bíblico: A natureza pecaminosa (Então Pedro, chamando-o à parte, começou a repreendê-lo.), Satanás e seus demônios (Saia da minha frente, Satanás!) e o mundo com o seu sistema (Porque você não leva em consideração as coisas de Deus, e sim as dos homens.).
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O custo do discipulado.
34Então, convocando a multidão e juntamente os seus discípulos, Jesus lhes disse: — Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. 35Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá; e quem perder a vida por minha causa e por causa do evangelho, esse a salvará.
Ser cristão envolve negar a si mesmo, tomar a sua cruz e segui-lo. A resposta fundamental ao amor radical de Deus por nós é que nós o amemos de forma radical. Note que o Senhor não menciona a abnegação, mas a negação do “eu”. Abnegação ascética é uma forma de egolatria. O mestre exige controle absoluto da vida de seus discípulos. Ele não deve ser apenas o primeiro lugar em nosso coração; deve ter o único lugar.
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O valor do discipulado.
36De que adianta uma pessoa ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? 37Que daria uma pessoa em troca de sua alma?
Existe o custo de alguma coisa e existe o valor atribuído a essa mesma coisa. Se você considerar muito alto o preço a ser pago para ser discípulo de Jesus, pondere no alto preço que foi pago pela salvação dos homens. O Senhor coloca as coisas em perspectiva: ganho temporário que traz perda eterna versus perda temporária que traz ganho eterno.
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A recompensa do discipulado.
38Pois quem, nesta geração adúltera e pecadora, se envergonhar de mim e das minhas palavras, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória do seu Pai com os santos anjos.
Cada indivíduo deverá comparecer diante de Deus e prestar contas de sua vida, atos e atitudes. A recompensa dos crentes será, graciosamente, experimentar a imputada justificação em Cristo Jesus no dia do Juízo de Deus.
VIVENDO COMO DISCÍPULO DE CRISTO
Discipulado é o termo que utilizamos para designar o ato de seguir a Cristo. Mas o que representa ser discípulo de Cristo na prática e como entramos em um relacionamento de discipulado com o Senhor?
- Os discípulos são chamados de acordo com a graça compassiva do Senhor.
João 15.16 Não foram vocês que me escolheram; pelo contrário, eu os escolhi e os designei para que vão e deem fruto, e o fruto de vocês permaneça, a fim de que tudo o que pedirem ao Pai em meu nome, ele lhes conceda. 17O que eu lhes ordeno é isto: que vocês amem uns aos outros.
Nenhuma pessoa pode se candidatar ao posto de discípulo de Cristo. Todos que Jesus chamou, ele na verdade convocou para ingressar em suas fileiras. O chamado é feito e, imediatamente, o indivíduo responde positivamente. A resposta do discípulo não é uma mera confissão oral de fé, mas um ato irrestrito de obediência e fidelidade. Isso ocorre por que Jesus chama não como mestre sábio e exemplo de vida, porém como o Cristo, o Filho de Deus.
Bonhoeffer descreve o acontece com os chamados:
E o que ocorre? O indivíduo que foi chamado deixa para trás tudo que possui não com o intuito de fazer algo especial, mas simplesmente por causa do chamado de Jesus, pois de outro modo não pode seguir seus passos. A esse ato não se atribui valor algum. É completamente sem sentido, insignificante. Pontes foram destruídas, e simplesmente segue-se em frente. Uma vez chamado, o ser humano tem de abandonar a existência que levava até então. Sua única tarefa passa a ser "existir", no sentido estrito do termo. Tem de abrir mão de tudo que viveu; o que é velho deverá ficar para trás. O discípulo deixa sua relativa segurança de vida e segue para a completa insegurança (isto é, na realidade, para a absoluta segurança e proteção da comunhão com Jesus); deixa uma situação aparentemente previsível e calculável (mas, na verdade, muito imprevisível) para a imprevisibilidade, para o acaso total (quer dizer, para a única coisa que é necessária e previsível); deixa o domínio das possibilidades limitadas (isto é, de fato, das possibilidades infinitas) para o domínio das possibilidades infinitas (ou seja, para a única realidade libertadora). Novamente, não se trata de uma lei de caráter geral, e sim da subversão de todo legalismo. Novamente, nada mais é senão a pura ligação com Jesus, ou seja, exatamente o oposto de todo programa preestabelecido, de todo idealismo ou legalismo. Porque Jesus é o único conteúdo, não pode haver qualquer outro. Ao lado dele não existem outros conteúdos Ele próprio é o único.
- Os discípulos devem responder com fé.
Marcos 1.15 Ele dizia: — O tempo está cumprido, e o Reino de Deus está próximo; arrependam-se e creiam no evangelho.
Os que foram chamados devem abandonar os seus pecados e seguir, confiando nele como Salvador e Senhor. No momento em que Jesus se voltou para nós e afirmou: “Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mc 8.34) nosso discipulado com Cristo tem início quando ouvimos esta ordem e obedecemos a ela com fé.
Ser cristão significa ser discípulo, não existem cristãos que não sejam discípulos e ser discípulo de Jesus significa segui-lo. Ou seja, não há discípulos de Jesus que não o sigam. Preferir o cristianismo em detrimento das outras religiões, viver uma vida moralmente irrepreensível ou nutrir comportamentos saudáveis - nada disso faz de você um cristão. Cristãos são pessoas que têm fé verdadeira em Cristo e que a demonstram ao depositar nele suas esperanças, seus temores e sua vida de forma plena. Os discípulos seguem o mestre aonde quer que ele os
guie pela fé. Não é mais você quem estabelece o programa de sua vida, e sim Jesus Cristo. Don Carson afirmou: “Morrer para si mesmo significa considerar melhor morrer a cobiçar; considerar melhor morrer a falar uma falsidade; considerar melhor morrer a... [nomeie o pecado]”. Isso é o que significa viver por meio da fé.
- O arrependimento é condição indispensável para um discípulo.
Marcos 1.15 Ele dizia: — O tempo está cumprido, e o Reino de Deus está próximo; arrependam-se e creiam no evangelho.
Jesus não é só nosso Salvador, ele é nosso Senhor. As pessoas nunca foram convidadas na Bíblia para aceitar a Cristo, porém, convocados a arrepender-se de seus pecados. Arrependimento não pode ser restrito a confessar diariamente os mesmos pecados e delitos e no dia seguinte cometê-los novamente. Arrependimento envolve reconhecimento da natureza pecaminosa que nos afasta do Deus santo – mudança de perspectiva. Tristeza absoluta pelos pecados cometidos e por nossa incapacidade de viver no mundo criado por Deus - mudança de coração. Finalmente, disposição sincera de abandonar a vida de crimes e viver de acordo com a lei de Deus – mudança de propósito. Contudo, devemos afirmar que o arrependimento não é uma obra meritória, mas uma reação interna.
- O discípulo faz discípulos
A vida cristã é uma vida discipulada que discípula outras pessoas. O cristianismo não é para solitários, egoístas e individualistas, é, entretanto, para peregrinos que trilham juntos pelo caminho estreito que conduz à vida eterna. Na chamada do discípulo é preciso seguir o caminho e guiando outros - é preciso ser amado e amar, perdoar e ser perdoado, servir e ser servido. Fazemos tudo isso, quando ajudamos outras pessoas a seguir Jesus ao longo da vereda da vida. É assim que você tem compreendido o cristianismo e o significado de ser cristão? Quando você vai à igreja aos domingos, só se preocupa com o que pode obter ou também busca formas de contribuir com as outras pessoas? E como você usa suas refeições, seus compromissos e o tempo livre ao longo da semana? Você planeja estratégias para evangelizar e edificar outros cristãos?
CONCLUSÃO
Nosso Senhor deixou uma ordem para todos os seus discípulos: fazer discípulos. Parte crucial de ser um discípulo, na verdade, é discipular. O cristianismo bíblico não é para o autossuficiente, egocêntrico e arrogante que não precisa de mais ninguém; é para os discípulos de Cristo, seguidores que guiam outras pessoas a também fazerem discípulos.
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