Perdão
Gênesis 33.1 Quando Jacó ergueu os olhos, viu que Esaú se aproximava, e com ele quatrocentos homens. Então repartiu os filhos entre Lia, Raquel e as duas servas. 2Pôs as servas e seus filhos à frente, Lia e seus filhos atrás deles e Raquel e José por último. 3E ele mesmo, adiantando-se, prostrou-se em terra sete vezes, até aproximar-se de seu irmão. 4Então Esaú correu ao encontro dele e o abraçou; pôs os braços em volta do pescoço dele e o beijou; e choraram. 5Daí, levantando os olhos, Esaú viu as mulheres e os meninos e disse: — Quem são estes que estão com você? Jacó respondeu: — Os filhos com que Deus agraciou este seu servo. 6Então se aproximaram as servas, elas e seus filhos, e se prostraram. 7Chegaram também Lia e seus filhos e se prostraram. Por último chegaram José e Raquel e se prostraram. 8Esaú perguntou: — Qual é o seu propósito com todos esses grupos que encontrei? Jacó respondeu: — É para obter favor na presença de meu senhor. 9Então Esaú disse: — Eu tenho muitos bens, meu irmão; guarde o que você tem. 10Mas Jacó insistiu: — Não recuse. Se alcancei favor na sua presença, peço que aceite o meu presente, porque ver o seu rosto é como contemplar o semblante de Deus; e você me acolheu tão bem. 11Portanto, aceite o meu presente, que eu lhe trouxe. Porque Deus tem sido generoso para comigo, e tenho fartura. E insistiu com ele, até que o aceitou. 12Então Esaú disse: — Vamos partir e seguir viagem. Eu irei à sua frente. 13Porém Jacó lhe disse: — Meu senhor sabe que estes meninos são fracos, e tenho comigo ovelhas e vacas de leite. Se forçados a caminhar demais um só dia, morrerão todos os rebanhos. 14Passe meu senhor adiante de seu servo; eu seguirei aos poucos, no passo do gado que me vai à frente e no passo dos meninos, até chegar a meu senhor, em Seir. 15Esaú respondeu: — Então permita que eu deixe com você alguns dessa gente que está comigo. Jacó respondeu: — Para quê? Basta que eu alcance favor aos olhos de meu senhor. 16Assim, naquele dia Esaú voltou para Seir, pelo caminho por onde tinha vindo. 17E Jacó foi para Sucote, e edificou para si uma casa, e fez cabanas para o seu gado. Por isso, o lugar se chamou Sucote. 18Voltando de Padã-Arã, Jacó chegou são e salvo à cidade de Siquém, que está na terra de Canaã, e armou a sua tenda junto da cidade. 19A parte do campo, onde tinha armado a sua tenda, ele a comprou dos filhos de Hamor, pai de Siquém, por cem peças de dinheiro. 20E levantou ali um altar e lhe deu o nome de “Deus, o Deus de Israel”. 34.1 Ora, Diná, a filha que Lia teve com Jacó, saiu para ver as filhas da terra. 2Quem a viu foi Siquém, filho do heveu Hamor, que era príncipe daquela terra. Tomando-a, ele teve relações com ela e assim a humilhou. 3Siquém se apegou a Diná, filha de Jacó, amou a jovem e lhe falou ao coração. 4Então Siquém disse a seu pai Hamor: — Consiga-me esta jovem para que seja a minha esposa. 5Quando Jacó ficou sabendo que Diná, sua filha, havia sido desonrada por Siquém, os seus filhos estavam no campo com o gado. Por isso, calou-se e esperou até que eles voltassem. 6Então Hamor, o pai de Siquém, saiu para falar com Jacó. 7Quando os filhos de Jacó vieram do campo e ouviram o que havia acontecido, indignaram-se e ficaram muito irados, pois Siquém havia praticado uma afronta em Israel, violentando a filha de Jacó, que era algo que não se devia fazer. 8Mas Hamor falou com eles, dizendo: — Meu filho Siquém está profundamente apaixonado pela filha de vocês. Peço que ela lhe seja dada por esposa. 9Tornem-se nossos parentes; deem as filhas de vocês para nós e vocês tomem as nossas filhas. 10Vocês habitarão em nosso meio, a terra estará ao seu dispor. Morem nela, negociem e adquiram propriedades. 11E o próprio Siquém disse ao pai e aos irmãos de Diná: — Que eu obtenha este favor diante de vocês e lhes darei o que me pedirem. 12Aumentem em muito o dote de casamento e as dádivas, e darei o que me pedirem; deem-me, porém, a moça por esposa. 13Então os filhos de Jacó, por haver Siquém desonrado Diná, a irmã deles, responderam com astúcia a Siquém e a seu pai Hamor e lhes disseram: 14— Não podemos fazer isso, dar a nossa irmã a um homem que ainda não foi circuncidado, porque isso seria uma vergonha para nós. 15Sob uma única condição permitiremos: que vocês se tornem como nós, circuncidando todos os do sexo masculino. 16Então lhes daremos as nossas filhas, tomaremos para nós as filhas de vocês, habitaremos no meio de vocês e seremos um só povo. 17Se, porém, não ouvirem e não quiserem ser circuncidados, tomaremos a nossa filha e iremos embora. 18Tais palavras agradaram Hamor e Siquém, seu filho. 19O jovem não tardou em fazer o que foi solicitado, porque amava a filha de Jacó e era o mais honrado de toda a casa de seu pai. 20Assim, Hamor e Siquém, seu filho, vieram ao portão da sua cidade e falaram aos homens da cidade: 21— Esses homens são pacíficos em relação a nós. Portanto, deixem que morem na terra e negociem nela. A terra é bastante espaçosa para contê-los. Vamos tomar as filhas deles por esposas e dar também as nossas filhas a eles. 22Mas eles só concordarão em morar conosco, tornando-nos um só povo, se todos os homens em nosso meio se deixarem circuncidar, como eles são circuncidados. 23Não é verdade que o gado, os bens e todos os animais deles serão nossos? Portanto, vamos concordar e eles ficarão morando entre nós. 24E todos os que saíam do portão da cidade deram ouvidos a Hamor e a Siquém, seu filho. E todos os do sexo masculino foram circuncidados, todos os que saíam pelo portão da cidade. 25No terceiro dia, quando os homens sentiam mais forte a dor, dois filhos de Jacó, Simeão e Levi, irmãos de Diná, pegaram cada um a sua espada, entraram inesperadamente na cidade e mataram todos os homens. 26Passaram também ao fio da espada Hamor e seu filho Siquém; tiraram Diná da casa de Siquém e saíram. 27Os filhos de Jacó vieram, passaram por cima dos cadáveres, e saquearam a cidade, porque a irmã deles havia sido desonrada. 28Levaram deles os rebanhos, os bois, os jumentos e o que havia na cidade e no campo. 29Pegaram todos os bens, levaram cativas as mulheres e todas as crianças, e saquearam tudo o que havia nas casas. 30Então Jacó disse a Simeão e a Levi: — Vocês me criaram um problema e me fizeram odioso entre os moradores desta terra, entre os cananeus e os ferezeus. Como somos pouca gente, eles se reunirão contra mim, e serei destruído, eu e a minha casa. 31Eles responderam: — E que direito ele tinha de tratar a nossa irmã como se fosse prostituta?
A passagem anterior terminou com o nascer de um novo dia, após o encontro noturno de Jacó com o Deus-homem. Nesse mesmo dia, ele encontra Esaú trazendo a solução para o conflito com seu irmão. O encontro de Jacó com Deus, em Peniel, foi uma preparação para o encontro incerto com Esaú. Esses dois encontros estão relacionados pelo ver a face – de Deus e de Esaú e a vida de Jacó ser poupada por eles.
Um novo Israel aproxima-se de Esaú, não o velho Jacó. Ele enfrenta seu irmão guerreiro e sua milícia com confiança, mas também com humildade. Esaú, por sua vez, é apresentado como um homem perdoador. Contudo, mostra-se mais do que apenas perdoador, ele chega até a oferecer uma escolta para seu irmão até sua terra. No entanto, falta-lhe uma virtude essencial para agradar a Deus: a fé. Ele desprezou seu direito de participar do destino prometido a Abraão.
A chegada de Jacó em Siquém prepara o palco para o episódio seguinte no capítulo 34. Existe um contraste marcante entre o perdão no anterior e a violência e vingança no seguinte. A cena ocorre em Canaã nos arredores de Siquém, algum tempo depois do encontro entre os irmãos. O que segue a esse estabelecimento são dois atos violentos que formam o núcleo da passagem: o estupro de Diná e a violência vingativa da cidade.
Os filhos de Jacó enfrentam violência com hostilidade; Jacó, com silêncio e não envolvimento. Mais uma vez, como no nascimento de seus filhos, o lar de Jacó é disfuncional por causa de sua passividade. Seus filhos são precipitados e desenfreados, e ele é passivo. Nesse momento crítico falta à família uma boa liderança. Jacó é excessivamente passivo em seu silêncio. No final, quando finalmente abre a boca, ele demonstra medo, não fé. Ele não luta nem com Deus nem com homens. O narrador usa apropriadamente seu antigo nome, Jacó, não seu novo nome, Israel. Ninguém nessa história escapa à censura.
O que conecta as duas histórias? Deus está presente, mesmo que na sombra. Assim como Deus orquestrou para efetuar a reconciliação de Jacó com seu irmão, ele permite/ordena os acontecimentos na cidade de Siquém. Em todos os casos, a maneira como cada um lidou com a ofensa, o perdão e a retribuição nos oferece lições preciosas.
Três encontros
A narrativa destaca três importantes encontros que foram determinantes para o cumprimento das promessas de Deus. Contudo, eles também revelam a abrangência do perdão de Deus, do coração maligno dos moradores de Siquém e do ressentimento dos filhos de Jacó.
Primeiro encontro: Jacó e Esaú.
1. A reconciliação dos irmãos (33.1-11)
Gênesis 33.1 Quando Jacó ergueu os olhos, viu que Esaú se aproximava, e com ele quatrocentos homens. Então repartiu os filhos entre Lia, Raquel e as duas servas. 2Pôs as servas e seus filhos à frente, Lia e seus filhos atrás deles e Raquel e José por último. 3E ele mesmo, adiantando-se, prostrou-se em terra sete vezes, até aproximar-se de seu irmão. 4Então Esaú correu ao encontro dele e o abraçou; pôs os braços em volta do pescoço dele e o beijou; e choraram. 5Daí, levantando os olhos, Esaú viu as mulheres e os meninos e disse: — Quem são estes que estão com você? Jacó respondeu: — Os filhos com que Deus agraciou este seu servo. 6Então se aproximaram as servas, elas e seus filhos, e se prostraram. 7Chegaram também Lia e seus filhos e se prostraram. Por último chegaram José e Raquel e se prostraram. 8Esaú perguntou: — Qual é o seu propósito com todos esses grupos que encontrei? Jacó respondeu: — É para obter favor na presença de meu senhor. 9Então Esaú disse: — Eu tenho muitos bens, meu irmão; guarde o que você tem. 10Mas Jacó insistiu: — Não recuse. Se alcancei favor na sua presença, peço que aceite o meu presente, porque ver o seu rosto é como contemplar o semblante de Deus; e você me acolheu tão bem. 11Portanto, aceite o meu presente, que eu lhe trouxe. Porque
Deus tem sido generoso para comigo, e tenho fartura. E insistiu com ele, até que o aceitou.
1 Quando Jacó ergueu os olhos, viu que Esaú se aproximava, e com ele quatrocentos homens. Então repartiu os filhos entre Lia, Raquel e as duas servas. Os encontros com Deus e com Esaú ocorrem em sequência. O narrador ainda não aliviou o suspense: ambas as cenas estão vinculadas pela menção de que Esaú está vindo com 400 homens.
2Pôs as servas e seus filhos à frente, Lia e seus filhos atrás deles e Raquel e José por último. As esposas e seus filhos se aproximam de Esaú em ordem ascendente de seu status social. No caso de Raquel e Lia, essa priorização baseia-se nas afeições de Jacó. Ele mantém seus entes mais queridos mais afastados do perigo. A família continua sofrendo com esse favoritismo.
3E ele mesmo, adiantando-se, prostrou-se em terra sete vezes, até aproximar-se de seu irmão. Enquanto Jacó saúda Esaú como um servo saúda seu senhor, Esaú saúda Jacó como “irmão” após uma longa separação. O novo Israel é um líder, não um covarde: com seu rosto no pó, está anulando sua apropriação indevida da bênção que ele tirara de Esaú por meio da fraude.
4Então Esaú correu ao encontro dele e o abraçou; pôs os braços em volta do pescoço dele e o beijou; e choraram. Esses são modos normais de saudar parentes amados. O narrador usa quatro verbos (correu, abraçou, beijou e chorou) para apresentar a reconciliação. Representam uma purificação de anos de emoções negativas.
5Daí, levantando os olhos, Esaú viu as mulheres e os meninos e disse: — Quem são estes que estão com você? Jacó respondeu: — Os filhos com que Deus agraciou este seu s e r v o. Esaú como parte superior inicia a conversa. Jacó espera que Esaú demonstre graça e poupe sua vida. Ele evita diplomaticamente usar o termo provocativo “abençoar” e, em vez disso, usa a palavra “agraciou” que sugere perdão.
8Esaú perguntou: — Qual é o seu propósito com todos esses grupos que encontrei? Jacó respondeu: — É para obter favor na presença de meu senhor. A honestidade não era um dos traços marcantes de Jacó, mas agora ele é honesto e sincero acerca de suas intenções.
9Então Esaú disse: — Eu tenho muitos bens, meu irmão; guarde o que você tem. Ambos os filhos, cada um ao seu modo, foram abençoados. Sutilmente, Esaú provoca: “fica com o direito de primogenitura e a bênção”.
10Mas Jacó insistiu: — Não recuse. Se alcancei favor na sua presença, peço que aceite o meu presente, porque ver o seu rosto é como contemplar o semblante de Deus; e vocême acolheu tão bem. Esse é o clímax da passagem, como em Peniel, quando Jacó viu a face de Deus e sua vida foi graciosamente poupada, agora ele também vê o temido rosto de Esaú e é recebido graciosamente. Jacó trata Esaú como alguém que está no lugar de Deus. Ele se prostra, implora por graça, identifica a face aplacada de Esaú com a face aplacada de Deus, e oferece um tributo quando encontra favor. O perdão e a reconciliação dos irmãos estão fundamentados no próprio Deus.
11Portanto, aceite o meu presente, que eu lhe trouxe. Porque Deus tem sido generoso para comigo, e tenho fartura. E insistiu com ele, até que o aceitou. Jacó oferece reparação por meio de um presente (uma oferta de reconciliação) a Esaú em troca da bênção usurpada. A linguagem utilizada é a linguagem da graça: Recebi de graça, logo, posso oferecer de graça. Se Esaú aceitar seu presente, Jacó saberá que também ele foi aceito, como quando Deus aceita o seu povo.
11... E insistiu com ele, até que o aceitou. Esaú aceita o presente como pagamento pelos males sofridos. O conflito com é resolvido por meio de expressões genuínas de arrependimento. A reconciliação é selada (quando Esaú aceita o presente da reparação) e testemunhada pelos 400 homens de Esaú e por toda a casa de Jacó.
2. A separação dos irmãos (33.12-20)
12Então Esaú disse: — Vamos partir e seguir viagem. Eu irei à sua frente. 13Porém Jacó lhe disse: — Meu senhor sabe que estes meninos são fracos, e tenho comigo ovelhas e vacas de leite. Se forçados a caminhar demais um só dia, morrerão todos os rebanhos. 14Passe meu senhor adiante de seu servo; eu seguirei aos poucos, no passo do gado que me vai à frente e no passo dos meninos, até chegar a meu senhor, em Seir. 15Esaú respondeu: — Então permita que eu deixe com você alguns dessa gente que está comigo. Jacó respondeu: — Para quê? Basta que eu alcance favor aos olhos de meu senhor. 16Assim, naquele dia Esaú voltou para Seir, pelo caminho por onde tinha vindo. 17E Jacó foi para Sucote, e edificou para si uma casa, e fez cabanas para o seu gado. Por isso, o lugar se chamou Sucote. 18Voltando de Padã-Arã, Jacó chegou são e salvo à cidade de Siquém, que está na terra de Canaã, e armou a sua tenda junto da cidade. 19A parte do campo, onde tinha armado a sua tenda, ele a comprou dos filhos de Hamor, pai de Siquém, por cem peças de dinheiro. 20E levantou ali um altar e lhe deu o nome de “Deus, o Deus de Israel”.
12Então Esaú disse: — Vamos partir e seguir viagem. Eu irei à sua frente. 13Porém Jacó lhe disse: — Meu senhor sabe que estes meninos são fracos, e tenho comigo ovelhas e vacas de leite. Se forçados a caminhar demais um só dia, morrerão todos os rebanhos. Jacó está tentando separar-se graciosamente de Esaú sem ofendê-lo. Ele declina a oferta de Esaú de escoltá-lo ao contrastar o ritmo mais lento dos pastores com a velocidade dos caçadores.
O narrador inspirado omite os motivos de Jacó para seguir na direção oposta a de seu irmão. Será que ele duvida da longevidade do humor amigável de Esaú? Será que ele considera imprudente seguir para Seir porque a terra não conseguiria sustentar ambos? No entanto, Esaú não guarda rancor dessa separação, pois no futuro os irmãos enterraram seu pai juntos e em paz (35.29).
14Passe meu senhor adiante de seu servo; eu seguirei aos poucos, no passo do gado que me vai à frente e no passo dos meninos, até chegar a meu senhor, em Seir. Jacó, respeitosamente, enganou Esaú. Ele não pretende se juntar ao seu irmão.
15Esaú respondeu: — Então permita que eu deixe com você alguns dessa gente que está comigo. Jacó respondeu: — Para quê? Basta que eu alcance favor aos olhos de meu senhor. Esaú sabe que essa é a maneira educada de Jacó recusar sua oferta. Jacó não podia recusar abertamente sem insultar Esaú.
17E Jacó foi para Sucote, e edificou para si uma casa, e fez cabanas para o seu gado. Por isso, o lugar se chamou Sucote. 18Voltando de Padã-Arã, Jacó chegou são e salvo à cidade de Siquém, que está na terra de Canaã, e armou a sua tenda junto da cidade. O patriarca volta a se estabelecer na terra prometida. Ele segue os passos de seu avô Abraão, fixando seu futuro na Terra Prometida - constrói um altar no mesmo lugar em que Abraão o fizera e adquire a terra pela fé.
19A parte do campo, onde tinha armado a sua tenda, ele a comprou dos filhos de Hamor, pai de Siquém, por cem peças de dinheiro. 20E levantou ali um altar e lhe deu o nome de “Deus, o Deus de Israel”. Embora a compra de terra e a construção do altar tenham sido atos de fé, Jacó erra ao se estabelecer na terra. Ele fizera um voto de adorar em Betel ao retornar para a Terra Prometida, mas ele leva pelo menos dez anos para cumprir seu voto. Os anos perto dos canaanitas refletem uma passividade espiritual de Jacó, que tem consequências terríveis. O comentário (19... comprou dos filhos de Hamor, pai de Siquém) prenuncia a cena terrível com Diná que está por vir.
O segundo encontro: Jacó e os estrangeiros
O narrador omite a data desse evento, muito provavelmente, ocorre mais ou menos uma década após Jacó ter se encontrado com Deus e com seu irmão Esaú. O encontro de Jacó com os moradores da terra apresenta contornos de tragédia. A violência se espalha rapidamente e ameaça a sobrevivência do povo escolhido de Deus.
1. Siquém, filho de Hamor, estupra Diná (34.1-12)
34.1 Ora, Diná, a filha que Lia teve com Jacó, saiu para ver as filhas da terra. 2Quem a viu foi Siquém, filho do heveu Hamor, que era príncipe daquela terra. Tomando-a, ele teve relações com ela e assim a humilhou. 3Siquém se apegou a Diná, filha de Jacó, amou a jovem e lhe falou ao coração. 4Então Siquém disse a seu pai Hamor: — Consiga-me esta jovem para que seja a minha esposa. 5Quando Jacó ficou sabendo que Diná, sua filha, havia sido desonrada por Siquém, os seus filhos estavam no campo com o gado. Por isso, calou-se e esperou até que eles voltassem. 6Então Hamor, o pai de Siquém, saiu para falar com Jacó. 7Quando os filhos de Jacó vieram do campo e ouviram o que havia acontecido, indignaram-se e ficaram muito irados, pois Siquém havia praticado uma afronta em Israel, violentando a filha de Jacó, que era algo que não se devia fazer. 8Mas Hamor falou com eles, dizendo: — Meu filho Siquém está profundamente apaixonado pela filha de vocês. Peço que ela lhe seja dada por esposa. 9Tornem-se nossos parentes; deem as filhas de vocês para nós e vocês tomem as nossas filhas. 10Vocês habitarão em nosso meio, a terra estará ao seu dispor. Morem nela, negociem e adquiram propriedades. 11E o próprio Siquém disse ao pai e aos irmãos de Diná: — Que eu obtenha este favor diante de vocês e lhes darei o que me pedirem. 12Aumentem em muito o dote de casamento e as dádivas, e darei o que me pedirem; deem-me, porém, a moça por esposa.
1 Ora, Diná, a filha que Lia teve com Jacó, saiu para ver as filhas da terra. A identificação do narrador da relação pai-filha expõe a vergonha da passividade de Jacó nos eventos que se seguem. Esse é um ato impróprio e imprudente: moças não costumavam entrar desacompanhadas numa cidade estranha. Cabe a Jacó, o pai, a responsabilidade de garantir que ela esteja acompanhada.
2Quem a viu foi Siquém, filho do heveu Hamor, que era príncipe daquela terra. Tomando-a, ele teve relações com ela e assim a humilhou. A expressão “tomando-a” é usada para os tiranos sexuais descritos em outros lugares da Bíblia. Chama a atenção a economia prudente do narrador inspirado acerca dos detalhes da violência brutal e desumana.
3Siquém se apegou a Diná, filha de Jacó, amou a jovem e lhe falou ao coração. Apesar de desejar assumir um compromisso com ela, ele não se desculpa ou tenta apaziguar a família prejudicada. Diabolicamente, os sentimentos agressivos de Siquém transformaram-se em “amor”. A apresentação do narrador é verídica e expressa o comportamento doentio muito presente em indivíduos violentos e abusivos que afirmam “amar” suas vítimas.
4Então Siquém disse a seu pai Hamor: — Consiga-me esta jovem para que seja a minha esposa. As suas palavras a seu pai refletem de forma mais honesta a sua atitude maligna. Ele não consegue suportar o engano durante muito tempo.
5Quando Jacó ficou sabendo que Diná, sua filha, havia sido desonrada por Siquém, os seus filhos estavam no campo com o gado. Por isso, calou-se e esperou até que eles voltassem. A omissão das emoções de Jacó é notável. Em outros textos, o narrador documenta suas emoções intensas (diante da suposta morte de José). Aparentemente, Jacó não considera o assunto importante o bastante para responder prontamente.
7Quando os filhos de Jacó vieram do campo e ouviram o que havia acontecido, indignaram-se e ficaram muito irados, pois Siquém havia praticado uma afronta em Israel, violentando a filha de Jacó, que era algo que não se devia fazer. O narrador omite como eles souberam do caso, mas não dá crédito a Jacó de tê-los informado. As reações corretas são atribuídas aos irmãos, não a Jacó.
Aqueles que cometem um ultraje moral do pior tipo contra as verdades e convicções mais profundas da comunidade precisam ser punidos para proteger o tecido da comunidade. Para a proteção da própria sociedade, esse tipo de atrocidade jamais pode ser tolerado ou permanecer impune. Espera-se que os magistrados civis, estabelecidos por Deus, ajam com severidade na punição daqueles que se comportam como Siquém.
8Mas Hamor falou com eles, dizendo: — Meu filho Siquém está profundamente apaixonado pela filha de vocês. Peço que ela lhe seja dada por esposa. Siquém pede a mão de Diná e o seu pai oferece pagar o dote, porém, não se desculpam pelo ato cometido. Eles falam como se o estupro nunca tivesse acontecido e como se Diná não fosse prisioneira em sua cidade. Não existe arrependimento verdadeiro, uma vez que não existe consciência dos atos. Nestes casos, sobram apenas o lamento pelos prejuízos sofridos pessoalmente e nenhum pelas ofensas causadas.
9Tornem-se nossos parentes; deem as filhas de vocês para nós e vocês tomem as nossas filhas. É isso o que Abraão e Isaque temiam. Mais tarde, a lei de Moisés proíbe a prática (Dt 7.3). Para Israel, o casamento com as mulheres canaanitas será considerado uma perversão. Precisamente por isso, existem termos tão restritos a respeito do casamento para os co-participantes do pacto.
10Vocês habitarão em nosso meio, a terra estará ao seu dispor. Morem nela, negociem e adquiram propriedades. 11E o próprio Siquém disse ao pai e aos irmãos de Diná: — Que eu obtenha este favor diante de vocês e lhes darei o que me pedirem. 12Aumentem em muito o dote de casamento e as dádivas, e darei o que me pedirem; deem-me, porém, a moça por esposa. A proposta busca satisfazer os desejos egoístas do coração do homem. Os filhos de Jacó são tentados em sua ganância e opulência. O suborno oferecido para que o estupro fosse esquecido é quase irresistível.
2. A resposta do filhos de Jacó: Um acordo traiçoeiro (34.13-24)
13Então os filhos de Jacó, por haver Siquém desonrado Diná, a irmã deles, responderam com astúcia a Siquém e a seu pai Hamor e lhes disseram: 14— Não podemos fazer isso, dar a nossa irmã a um homem que ainda não foi circuncidado, porque isso seria uma vergonha para nós. 15Sob uma única condição permitiremos: que vocês se tornem como nós, circuncidando todos os do sexo masculino. 16Então lhes daremos as nossas filhas, tomaremos para nós as filhas de vocês, habitaremos no meio de vocês e seremos um só povo. 17Se, porém, não ouvirem e não quiserem ser circuncidados, tomaremos a nossa filha e iremos embora. 18Tais palavras agradaram Hamor e Siquém, seu filho. 19O jovem não tardou em fazer o que foi solicitado, porque amava a filha de Jacó e era o mais
honrado de toda a casa de seu pai. 20Assim, Hamor e Siquém, seu filho, vieram ao portão da sua cidade e falaram aos homens da cidade: 21— Esses homens são pacíficos em relação a nós. Portanto, deixem que morem na terra e negociem nela. A terra é bastante espaçosa para contê-los. Vamos tomar as filhas deles por esposas e dar também as nossas filhas a eles. 22Mas eles só concordarão em morar conosco, tornando-nos um só povo, se todos os homens em nosso meio se deixarem circuncidar, como eles são circuncidados. 23Não é verdade que o gado, os bens e todos os animais deles serão nossos? Portanto, vamos concordar e eles ficarão morando entre nós. 24E todos os que saíam do portão da cidade deram ouvidos a Hamor e a Siquém, seu filho. E todos os do sexo masculino foram circuncidados, todos os que saíam pelo portão da cidade.
13Então os filhos de Jacó, por haver Siquém desonrado Diná, a irmã deles, responderam com astúcia a Siquém e a seu pai Hamor e lhes disseram: 14— Não podemos fazer isso, dar a nossa irmã a um homem que ainda não foi circuncidado, porque isso seria uma vergonha para nós. Jacó não responde e passivamente observa seus filhos responderem. Os irmãos exigem que o povo de Siquém qualifique-se para participar da comunidade do pacto concordando em circuncidar todos os seus homens. Embora o narrador aprove a indignação moral dos irmãos, ele não aprova sua tática – o tom da narrativa assume outra frequência.
15Sob uma única condição permitiremos: que vocês se tornem como nós, circuncidando todos os do sexo masculino. 16Então lhes daremos as nossas filhas, tomaremos para nós as filhas de vocês, habitaremos no meio de vocês e seremos um só povo. 17Se, porém, não ouvirem e não quiserem ser circuncidados, tomaremos a nossa filha e iremos embora. Eles esvaziam inconsequentemente o sinal da aliança de seu significado espiritual - o compromisso pela fé com o Deus de Abraão - ao abusar dele para executar vingança. Não existe fervor evangelístico genuíno.
A astúcia dos irmãos é carregada de ironia: A parte do corpo usada por Siquém em sua violência será a fonte de sua própria punição.
18Tais palavras agradaram Hamor e Siquém, seu filho. 19O jovem não tardou em fazer o que foi solicitado, porque amava a filha de Jacó e era o mais honrado de toda a casa de seu pai. O jovem não perdeu tempo porque estava apaixonado. Na visão do mundo, isso é amor e então, nada mais importa.
20Assim, Hamor e Siquém, seu filho, vieram ao portão da sua cidade e falaram aos homens da cidade: 21— Esses homens são pacíficos em relação a nós. Portanto, deixem que morem na terra e negociem nela. A terra é bastante espaçosa para contê-los. Vamos tomar as filhas deles por esposas e dar também as nossas filhas a eles. As relações são meramente comerciais e funcionais: há espaço suficiente, e é economicamente vantajoso.
Hamor e Siquém enganam os habitantes da cidade ao não declararem o seu motivo último ou especificam os detalhes do acordo. Em vez disso, eles instigam a sua ganância e perversidade.
22Mas eles só concordarão em morar conosco, tornando-nos um só povo, se todos os homens em nosso meio se deixarem circuncidar, como eles são circuncidados. 23Não é verdade que o gado, os bens e todos os animais deles serão nossos? Portanto, vamos concordar e eles ficarão morando entre nós. 24E todos os que saíam do portão da cidade deram ouvidos a Hamor e a Siquém, seu filho. E todos os do sexo masculino foram circuncidados, todos os que saíam pelo portão da cidade. Eles não pretendem abraçar a aliança de Israel com Deus simbolizada pela circuncisão. É apenas um meio de lucrar financeiramente, reforçando a sua própria cosmovisão. Eles estão dispostos a aceitar o sinal da aliança como meio de adquirir vantagens sem conversão.
Terceiro encontro: Os filhos de Jacó e a cidade
A vingança e a barbárie marcam o terceiro encontro da passagem. A atitude desmedida dos filhos de Jacó expressam o seu coração maligno.
25No terceiro dia, quando os homens sentiam mais forte a dor, dois filhos de Jacó, Simeão e Levi, irmãos de Diná, pegaram cada um a sua espada, entraram inesperadamente na cidade e mataram todos os homens. 26Passaram também ao fio da espada Hamor e seu filho Siquém; tiraram Diná da casa de Siquém e saíram. 27Os filhos de Jacó vieram, passaram por cima dos cadáveres, e saquearam a cidade, porque a irmã deles havia sido desonrada. 28Levaram deles os rebanhos, os bois, os jumentos e o que havia na cidade e no campo. 29Pegaram todos os bens, levaram cativas as mulheres e todas as crianças, e saquearam tudo o que havia nas casas. 30Então Jacó disse a Simeão e a Levi: — Vocês me criaram um problema e me fizeram odioso entre os moradores desta terra, entre os cananeus e os ferezeus. Como somos pouca gente, eles se reunirão contra mim, e serei destruído, eu e a minha casa. 31Eles responderam: — E que direito ele tinha de tratar a nossa irmã como se fosse prostituta?
25No terceiro dia, quando os homens sentiam mais forte a dor, dois filhos de Jacó, Simeão e Levi, irmãos de Diná, pegaram cada um a sua espada, entraram inesperadamente na cidade e mataram todos os homens. Simeão e Levi eram irmãos da mesma mãe de Diná. Os irmãos respondem com violência desenfreada e barbárie inescrupulosa.
Embora seu desejo de punir Siquém seja justo, eles reagem exageradamente e lançam-se precocemente numa guerra, sem a sanção divina. Por causa de sua vingança irrestrita e apressada, Simeão e Levi perdem a liderança e a terra em Israel.
26Passaram também ao fio da espada Hamor e seu filho Siquém; tiraram Diná da casa de Siquém e saíram. Agora o leitor compreende que Diná fora mantida refém na casa de Siquém durante todo esse tempo. Siquém e seu pai jamais ofereceram uma negociação honesta.
27Os filhos de Jacó vieram, passaram por cima dos cadáveres, e saquearam a cidade, porque a irmã deles havia sido desonrada. 28Levaram deles os rebanhos, os bois, os jumentos e o que havia na cidade e no campo. 29Pegaram todos os bens, levaram cativas as mulheres e todas as crianças, e saquearam tudo o que havia nas casas. O narrador faz de tudo para explicar que o seu motivo era vingar a violação da irmã. Ele coloca os outros irmãos envolvidos na vingança sangrenta.
30Então Jacó disse a Simeão e a Levi: — Vocês me criaram um problema e me fizeram odioso entre os moradores desta terra, entre os cananeus e os ferezeus. Como somos pouca gente, eles se reunirão contra mim, e serei destruído, eu e a minha casa. Jacó reprova seus filhos por sua imprudência; eles o repreendem por sua falta de indignação moral.
As reações contrárias de Jacó a violência contra os moradores da cidade não correspondem às suas reações contrárias ao estupro de Diná. Jacó não demonstra ultraje moral e os filhos justificam sua matança como punição. A tristeza de Jacó é menos do que honrável. Sua repreensão é fruto de um coração temeroso. Ele está preocupado consigo mesmo, não com a humilhação de Diná. Suas preocupações são de natureza humana e carnal, não de natureza ética. Os patriarcas precisavam sobreviver na terra pela fé, não pela guerra. Aqui Jacó demonstra medo, não fé obediente.
31Eles responderam: — E que direito ele tinha de tratar a nossa irmã como se fosse prostituta? O narrador deixa a última palavra com os filhos de Jacó.
O dilema do perdão
No primeiro episódio, o narrador estabelece uma conexão entre o fato de Esaú perdoar e poupar a vida de Jacó e o fato de Deus poupar sua vida. Assim como Esaú aceita o tributo de Jacó e recebe-o com perdão, Deus graciosamente recebe os eleitos porque Cristo se deu a si mesmo por seus pecados. No segundo, o autor inspirado, revela que nem Siquém nem Hamor consideram o estupro ofensivo. Eles ignoram a ofensa e só querem negociar um acordo financeiro para o casamento. Jacó, infelizmente, não demonstra indignação moral e só quer resolver o assunto com prudência. Simeão e Levi, juntamente com os outros filhos de Jacó, apesar de terem corretamente demonstrado sua indignação moral diante da violação de sua irmã, desqualificam-se por meio de sua vingança apressada e irrestrita. Tudo isso suscita a questão: como podemos lidar com a ofensa, o perdão e a retribuição?
Paulo instruiu os irmão de Éfeso nestes termos:
Efésios 4.30 Não entristeçam o Espírito Santo de Deus, com o qual vocês foram selados para o dia da redenção. 31Livremse de toda amargura, indignação, ira, gritaria e calúnia, bem como de toda maldade. 32Sejam bondosos e compassivos uns para com os outros, perdoandose mutuamente, como Deus os perdoou em Cristo.
Ao introduzir a tristeza do Espírito Santo aos intrincados relacionamentos humanos, Paulo, fundamentou o perdão humano no perdão divino. O Espírito Santo odeia o pecado, a discórdia, a amargura, o ressentimento e a violência. Ele naturalmente se opõe a tais coisas. Então, se quisermos evitar que o Espírito Santo fique entristecido, devemos fugir de tais comportamentos. Isso não é novidade, Jesus já havia ensinado essa verdade. O evangelista Mateus registrou:
Mateus 18.32― Então, o senhor chamou o servo e disse: “Servo mau, cancelei toda a sua dívida porque você me implorou. 33Não deveria você ter tido misericórdia do seu conservo, como eu tive de você?”. 34Irado, o seu senhor entregouo aos torturadores, até que pagasse tudo o que devia. 35― Assim também fará o meu Pai celestial a vocês se cada um não perdoar de coração o seu irmão.
Algumas pessoas interpretam o versículo 35 como se Jesus condicionasse o perdão de Deus ao perdão humano. De forma que o perdão de Deus fosse conquistado por nossa própria capacidade de perdoar. Mas o contexto não se alinha, em momento algum, com essa interpretação. Na verdade, na parábola, o rei estende o seu perdão incondicional primeiro, depois exige que o seu servo faça o mesmo. Então, a última frase de Jesus significa que o perdão de Deus deve transformar nosso coração para que possamos perdoar como Deus nos perdoou. Se não somos capazes de perdoar, evidencia que talvez não nos arrependemos realmente a ponto de receber o perdão de Deus. Para tais pessoas, o perdão de Deus é um conceito - eles sabem o que é, porém, não é uma realidade aplicável em suas próprias vidas. A ideia central é que o perdão real e bíblico dependa do perdão oferecido por Deus e experimentado pelo crente.
As dimensões do perdão
Gênesis 33.10 Mas Jacó insistiu: — Não recuse. Se alcancei favor na sua presença, peço que aceite o meu presente, porque ver o seu rosto é como contemplar o semblante de Deus; e você me acolheu tão bem.
O perdão tem três dimensões distintas que se alinham perfeitamente as três ênfases teológicas de Gênesis:
● GRAÇA - A dimensão pessoal.
Efésios 4.30 Não entristeçam o Espírito Santo de Deus, com o qual vocês foram selados para o dia da redenção. 31Livremse de toda amargura, indignação, ira, gritaria e calúnia, bem como de toda maldade.
Normalmente, a primeira reação quando alguém peca contra o outro é o ofendido pensar nele mesmo. Na sua queixa, nos seus direitos, na sua perda e no seu sofrimento. Involuntariamente, quando somos ofendidos nosso coração se enche de justiça própria e começamos então a pensar em tudo o que perdemos por causa da ofensa.
A orientação de Paulo, não é um incentivo à auto piedade ou ao egoísmo. Devemos pensar em nós mesmos, não no nível de nossos prejuízos, mas no alcance de nossas próprias ofensas. Um olhar atento no espelho de Deus revela não a extensão dos meus ferimentos, mas a medida em que tenho ferido o Senhor por causa de meus pecados. Não as maneiras que eu tenho sido ofendido, mas na longa lista de minhas próprias ofensas. Não em meus sentimentos de rejeição, mas como eu já rejeitei a Deus.
Qual era o problema essencial do servo impiedoso descrito por Jesus (Mt 18.21- 35)? Ele esqueceu de si mesmo e do tamanho de sua própria dívida. Portanto, antes de contabilizar seus muitos prejuízos, comece por contabilizar os grandes prejuízos que você mesmo causou a Deus.
Por sua obediência, morte e ressurreição, Jesus nos reconciliou com Deus e também nos reconciliou com todas as outras pessoas que são reconciliadas com ele. Embora os cristãos sejam chamados a estar prontos a perdoar mesmo não-cristãos, a expressão “perdoando-vos uns aos outros” tem um significado especial para os crentes. Nossos irmãos e irmãs são ramos de uma mesma árvore, pedras do mesmo edifício, e partes de um mesmo corpo.
Quando somos ofendidos temos a tendência de pensar sempre o pior em relação a pessoa que nos ofendeu. Somos influenciados – justamente – a considerar essa pessoa como alguém do mal, um enviado das trevas para nos prejudicar. Esquecemos que, em muitos casos, estamos falando de uma pessoa que Cristo morreu para salvar, de alguém que ama a Deus e tem temor por ele. Por isso, quando formos ofendidos, que o Espírito Santo nos encoraje a ponderar sobre nossa união com Cristo e uns com os outros. Podemos viver em paz uns com os outros, porque “ele é a nossa paz”.
Nesse sentido, algumas implicações práticas devem ser adotadas: 1. Praticandooperdão
Invariavelmente situações exigem confrontação e reconciliação. Entretanto, sabemos também que não devemos ser muito sensíveis e que seria improdutivo repreender alguém cada vez que não somos tratados da maneira que desejamos. Como podemos equilibrar a tensão da obrigação de corrigir com a necessidade de moderação? Jesus ensinou o caminho da disciplina entre os irmãos:
Mateus 18.15 “Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão. 16Mas, se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que ‘qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas’. 17Se ele se recusar a ouvi-los, conte à igreja; e, se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão ou publicano. 18“Digo a verdade: Tudo o que vocês ligarem na terra terá sido ligado no céu, e tudo o que vocês desligarem na terra terá sido desligado no céu. 19“Também digo que, se dois de vocês concordarem na terra em qualquer assunto sobre o qual pedirem, isso será feito a vocês por meu Pai que está nos céus. 20Pois onde se reunirem dois ou três em meu nome, ali eu estou no meio deles”.
O procedimento em três estágios proposto por Jesus pretende:
1) Manter a questão restrita a um grupo mínimo de pessoas.
Mateus 18.15 “Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão. 16Mas, se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que ‘qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas’.
Jesus disse para cada crente resolver a situação com o outro sem a necessidade de envolver demais pessoas, inclusive líderes. Essa atitude evita que outros pecados sejam cometidos como a maledicência, os juízos temerários e as calúnias. O intuito é manter o mínimo conhecimento público com relação ao pecado.
2) O propósito é o arrependimento do pecador e não a sua condenação.
Mateus 18.15“Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão.
O objetivo final de qualquer correção deve ser o arrependimento do pecador impenitente e não a sua destruição. A correção não pode ser exercida com espírito justiceiro ou vingativo. Ela é amorosa porque demonstra amor pelo indivíduo, pela igreja e pelo mundo que observa o nosso santo procedimento e especialmente, amor por Cristo - afinal Deus “disciplina a quem ama” (Hebreus 12.6).
3) Estabelecer a cultura da prestação de contas.
Mateus 18.15“Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão.
As pessoas não estão acostumadas a responder pelos próprios pecados, normalmente temos a tendência de espiritualizar (culpar as forças espirituais), terceirizar (culpar os outros) ou normatizar (culpar a sociedade) pelos pecados.
Jesus convoca seus discípulos para o arrependimento como forma de lidar com os pecados. Essa é a essência da confrontação: ajudar o outro a ser cada vez mais semelhante a Cristo pela correção do pecado.
Ao admoestar alguém nos tornamos servos. Afinal, qualquer amor que tenha medo de confrontar o amado não é amor de verdade. O medo de confrontar expressa um desejo de ser amado e aceito e por isso evita o confronto. Ademais, a indolência e a covardia são sempre egoístas, uma vez que colocam as próprias necessidades em primeiro lugar. O verdadeiro amor é disposto a confrontar e até mesmo prejudicar o relacionamento a curto prazo se existir possibilidade de cooperar com o outro.
2. Recebendo o confronto
Como receber a correção de seu irmão em caso de ofensa? É consenso que receber admoestação não é uma tarefa fácil e não estamos habituados com ela. Ninguém gosta de ser confrontado ou admoestado. Neste sentido, algumas atitudes podem facilitar nossa aceitação da situação:
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● Ore e peça a Deus que lhe conceda sabedoria e graça para lidar com seus pecados.
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● Não fique na defensiva. Evite dar desculpas e pense com honestidade se você está praticando o que seu irmão está apontando. Não acuse de volta, nem aponte erros do passado.
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● Creia na providência e no cuidado de Deus. O Senhor está usando toda essa situação para tratar áreas de pecado na sua vida.
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● Não interrompa a pessoa. Nunca impeça o outro de manifestar suas frustrações e desalentos. Mostre empatia mesmo que você tenha sido mal compreendido.
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● Procure saber mais detalhes da situação. Faça perguntas para descobrir os reais motivos da ofensa. Não simplifique a dor do seu irmão.
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● Crie um ambientes eguro para o outro se abrir com você. Não deixe o outro sentir que você não está dando a devida importância para a situação.
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● Responda com arrependimento. O arrependimento é o caminho escolhido por Deus para tratar com as feridas dos relacionamentos. O arrependimento verdadeiro tem três aspectos: (1) confissão a Deus; (2) confissão a pessoa prejudicada e (3) mudança de atitude imediata.
● Evite exageros desnecessários. Não exagere em suas reações. Não ameace o outro com o seu problema. Nunca permita a autocomiseração.
3. Quando não existe admissão de culpa?
Mateus 18.15“Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão. 16Mas, se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que ‘qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas’. 17Se ele se recusar a ouvi-los, conte à igreja; e, se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão ou publicano.
Pode ser que seu irmão não aceite a admoestação. Neste caso, a orientação é buscar ajuda de conselheiros dentro da própria igreja. Porém, tome cuidado de não escolher conselheiros que vão falar somente o que você deseja ouvir.
Em último caso, e em casos graves de pecado pode ser saudável a disciplina eclesiástica do indivíduo. Entretanto, devemos nos conformar em aceitar pedidos de desculpas ou mesmo promessas de arrependimento sem exigir que as pessoas admitam mais do que aceitam sinceramente. Se existir arrependimento completo, então o relacionamento volta ao estágio anterior a ofensa. Se o arrependimento for parcial, talvez o relacionamento vai precisar se ajustar a realidade atual e sair enfraquecido.
Geralmente, é mais difícil perdoar pessoas que não querem admitir o erro e que continuam obstinadas. O perdão neste caso pode ser mais demorado e vai depender de outros recursos como orar e meditar na Palavra de Deus, em especial, nas passagens que ressaltam o perdão de Deus para com seu povo.
Quando alguém peca contra nós, tendemos a limitar cuidadosamente os termos de perdão. Normalmente, procuramos brechas ou exceções para o perdão - como Pedro, queremos manter o perdão em doses pequenas e mesquinhas: “sete vezes, Senhor?”. A terceira dimensão do perdão reorienta o nosso coração quando nos dirige a meditar sobre o nosso Salvador: “como Deus, em Cristo, vos perdoou”.
O perdão do nosso Deus em Cristo é incrivelmente grande. A Bíblia nos diz que é em favor de muitas pessoas. Que Deus perdoa todos os tipos de iniquidades e lança o pecado infinitamente longe do pecador. O perdão de Deus é completo e irrevogável. É setenta vezes sete. Você, que foi perdoado, deve ir e fazer o mesmo, orienta Paulo.
Portanto, uma maneira absolutamente eficaz de perdoar outra pessoa é pensando no grande perdão de Deus e em como ele alcançou as pessoas de forma graciosa e amorosa. Deus é o único ser que teria o direito de reter o perdão ou de fazer exigências para perdoar, mas ele não faz isso. Pensar em Deus e no seu amor pode amolecer nosso coração para perdoar as ofensas que sofremos. Jesus, porém, não é apenas um exemplo de perdão. Ele é a fonte de nosso perdão. Essa é uma boa notícia, pois, tendo sido chamado para perdoar, eu quero sentar e protestar: “Eu não consigo!”. Todavia, posso orar e pedir ao Senhor: Me ajude, ó grande perdoador!
Conclusão
Talvez esse seja o tema mais complexo e difícil de ser tratado na igreja. Sua dificuldade está presente nas variadas e intrincadas situações que exijam perdão ou humildade de reconhecer os erros. Todavia, em qualquer caso, o caminho parece ser o mesmo: primeiro, lembre-se de seus pecados; depois, do grande e extenso perdão de Deus; e por último, do amor e da misericórdia de Deus. Fazendo assim, certamente, circunstâncias insolúveis serão apaziguadas.
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